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Famílias de baixa renda encontram dificuldades para lidar com a pandemia

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Nos últimos meses o mundo mudou radicalmente. Afetados pela pandemia do novo coronavírus, diversos países tomaram medidas de prevenção para evitar a disseminação da COVID-19, fazendo com que as rotinas das pessoas mudassem drasticamente.

A pandemia fez com que várias famílias tivessem que se reestruturar e mudar suas rotinas de uma forma integral. Edilene dos Santos, 48 ​​anos, moradora da Ceilândia (DF) a mais de trinta anos, descreve: “Vendia roupas, joias, essas coisas. Por causa da pandemia, pelo fato de eu ser hipertensa e diabética, eu tô evitando ao máximo sair. Não vou nem no mercado, porque meus meninos não querem ”.

Para evitar a propagação em massa do novo coronavírus, o Governo do Distrito Federal adotou diversas medidas, tais como: suspensão de aulas, uso obrigatório de máscaras, e fechamento de alguns estabelecimentos comerciais, o que ocasionou diversos prejuízos nas rendas de trabalhadores informais.

Márcia Fernanda de Jesus, 35 anos, possui um salão de beleza e conta como fez para se adequar a situação. “Atendia no salão e tinha mais cliente e deu uma diminuída ... eu tenho muitas clientes fixas, então eu vou na residência delas”.

De acordo com o Ministério da Saúde, a transmissão da doença acontece de uma pessoa para outra por meio do contato próximo, através de toque do aperto de mão, gotículas de saliva, espirros, tosse e coriza. Também ocorre por meio do contato com objetos ou superfícies contaminadas, como celulares, mesas, maçanetas, brinquedos, teclados de computador, entre outros.

A Organização Mundial da Saúde (OMS), estabeleceu algumas medidas essenciais que devem ser tomadas individualmente ao sair na rua e dentro de casa. Entre elas estão manter a higienização das mãos através de lavagem com sabão e uso de álcool em gel, manter o distanciamento de no mínimo 1m dos outros indivíduos e evitar o toque nas regiões do rosto.

Em Brasília, os casos estão subindo consideravelmente. Até 14 de junho, haviam 20.586 contaminados pela doença. Entre as cidades contaminadas, Ceilândia possui um dos maiores números, com o total de 2.911 casos e 64 óbitos, ultrapassando o Plano Piloto.

Diante do avanço de casos na região, a doméstica Francisca Vieira da Silva, 40 anos, conta que sente medo e preocupação devido a essa situação. “Se eu tenho medo? Eu tenho ... tenho muito. No começo eu dizia que não. Se for pra gente ficar doente será em qualquer lugar, dentro de casa ou na rua. Mas agora eu tenho. Eu tô vendo como é que tá a coisa… eu tenho medo sim ”.

Dificuldades para lidar com as consequências da pandemia

Na cidade de Ceilândia (DF), algumas pessoas encontram dificuldades para lidar com a situação, seja por questões financeiras, psicológicas, higiênicas, ou por conta do pequeno espaço. “Minha vó tem mal de Alzheimer, então ela nem sabe o que tá acontecendo, ela não tem mais noção”, conta Márcia sobre a sua avó de 89 anos.

Para preservar a saúde da idosa, uma das medidas que ela encontrou foi se manter isolada em um quarto separado para diminuir o risco de contágio.

Por conta de questões financeiras, Márcia também encontrou dificuldades ao fazer as compras dos materiais de limpeza. “No começo para comprar estava difícil, pois o valor do álcool em gel estava muito alto, só que agora está mais tranquilo”, relata.

Quanto à higiene da casa, a cabeleireira encontrou uma maneira para evitar a disseminação da doença. “A casa a gente está higienizando com água sanitária… às vezes não conseguimos higienizar as maçanetas o tempo todo, mas assim que possível limpamos.”

Já em relação à higienização pessoal, a tarefa se torna um pouco mais fácil: “se eu sair rápido lavo as mãos, passo álcool em gel, que fica em cima da mesa para todos usarem”, explica.

Para auxiliar a população durante o período de quarentena diante do grande índice de desemprego gerado devido ao isolamento social, o Governo Federal concedeu o Auxílio Emergencial, destinado aos trabalhadores informais, microempreendedores individuais, autônomos e desempregados. O benefício tem por objetivo fornecer um auxílio econômico durante o período de crise gerado pela pandemia. 

Apesar disso, são inúmeras as reclamações realizadas por conta do benefício, devido à demora de análise dos dados e por erros gerados no sistema. Muitas pessoas que atendem aos requisitos tiveram o auxílio negado.

Francisca é uma dessas pessoas. A moradora de Ceilândia se mudou para a cidade a 4 meses. Vinda de São Paulo, a desempregada teve o benefício negado, mesmo atendendo todas as exigências para se tornar uma beneficiada.

Carolina Azevedo, moradora da Ceilândia Sul, relata que seus avós vieram para Brasília em uma viagem, e por conta da pandemia não puderam retornar para casa, portanto atualmente estão morando com ela durante o período de isolamento social.

“Eles evitam ao máximo assistir a televisão pra não se preocuparem, os dois já são bem idosos e tudo isso que estamos vivendo assusta bastante eles”. Ela acrescenta ainda que “eles são bem otimistas e sabem que logo logo vai passar”. 

Para evitar a contaminação, Carolina conta que só sai de casa em casos de extrema necessidade: “ao sair, quando voltamos, lavamos bem as mãos e higienizados todos os produtos que compramos antes de guardar”.

Os problemas psicológicos são outros fatores que afetam a população durante o isolamento social. Lidar com a ansiedade e o estresse durante a quarentena está se tornando um dos maiores desafios. “Situações instáveis como esta podem gerar sintomas de estresse e de ansiedade. Alterações no sono, no apetite, sentimentos de medo e desesperança e grandes dúvidas sobre o futuro são totalmente esperados neste momento”, explica a psicóloga Isadora Araújo.

Francisca conta que devido à pandemia ela enfrenta noites de insônia. “Eu não tô dormindo... tô dormindo muito pouco. Eu me preocupo com tudo. Me preocupo com tanta coisa, meu Deus do céu”.

O médico psiquiatra Luan Diego Marques comenta que ter ansiedade nesse momento é completamente normal. “A ansiedade é uma reação natural do nosso organismo frente a uma ameaça ou situação de perigo, em situações de tragédia ou pandemia é natural que o nível de alerta das pessoas se eleve, e a ansiedade também.”

Na residência de Carolina, um dos meios encontrados para tentar lidar com o estresse e o medo é evitar o contato com um grande número de informações e fazer o possível para manter a distração durante o isolamento.

“Bom, a única coisa que temos que fazer é tentar se distrair e não pensar nessa calamidade que estamos vivendo... evitamos o máximo assistir televisão pra não ter que ver o quanto tá complicada a situação, e pensar principalmente que logo logo isso vai passar e vamos poder estar toda a família junta de novo”, descreve.

A psicóloga Isadora aponta que para lidar com o estresse e a ansiedade durante essa situação é essencial manter uma rotina de tarefas e evitar ao máximo o contato contínuo com notícias negativas.

“Manter uma rotina com tarefas que você dá conta de fazer (lavar a louça, fazer as próprias refeições, ou outras atividades que estão dentro das suas possibilidades) pode ser um bom começo”, recomenda. Ela complementa ainda que “filtrar a quantidade de informações que recebemos a todo o momento é fundamental. Estar sempre vendo as redes sociais, televisão, e outros sites na internet pode ser muito desgastante, por isso é bom colocar limites no tempo que você tem contato com essas informações”. 

Para as famílias que residem em um pequeno espaço e possuem muitos membros, os fatores psicológicos não são o único problema. Os conflitos gerados dentro de casa entre as crianças dificultam ainda mais o processo de isolamento. É o que alerta o psiquiatra Marques: “Famílias de baixa renda que, muitas vezes, vivem em cômodos pequenos possuem uma maior limitação de circulação, e essa restrição é um fator para aumento dos conflitos familiares”.

Para as famílias que residem em um pequeno espaço e possuem muitos membros, os fatores psicológicos não são o único problema. Os conflitos gerados dentro de casa entre as crianças dificultam ainda mais o processo de isolamento. É o que alerta o psiquiatra Marques: “Famílias de baixa renda que, muitas vezes, vivem em cômodos pequenos possuem uma maior limitação de circulação, e essa restrição é um fator para aumento dos conflitos familiares”.

Na casa de Edilene, no Setor P Sul (Brasília - DF), um dos maiores desafios, é mediar as brigas entre seus três filhos: “tá difícil... de vez em quando tem umas desavenças, eu vou lá e tento conciliar. Os meninos brigam, aí eu falo para pararem com isso, aí eles dizem que não tem nada para fazer dentro de casa”, relata.

O psiquiatra Luan Diego aponta que em famílias de baixa renda, os fatores psicológicos podem influenciar de uma forma negativa devido a uma maior quantidade de preocupação e insegurança.

“Primeiro é o impacto de saúde… pessoas com nível socioeconômico desfavorecido tendem a ter mais obstáculos para cuidar de doenças como diabetes e hipertensão, doenças que são fatores de vulnerabilidade para a COVID-19”, descreve.

Além disso, o médico acrescenta que esse fator “deixa as famílias com uma maior sensação de insegurança, principalmente por em boa parte dependerem do Sistema Único de Saúde, que apresenta fragilidade frente às demandas”.

Carolina conta que devido ao pequeno espaço e a grande quantidade de membros da família, alguns momentos são de agonia: “É ruim, pois não temos muito espaço, aí é tudo muito pequeno e como temos que ficar em casa, sem poder sair, é um pouco agoniante, ainda mais porque meus avós estão aqui”.

Dica do especialista:

Perguntamos para a Psicóloga Isadora Araújo e para o psiquiatra Luan Diego quais medidas podem ser recuperadas para manter a saúde mental durante uma pandemia, confira:

Quais exercícios podem ser feitos para lidar com a situação?

“Uma boa dica são os exercícios respiratórios. Quando estamos ansiosos o ritmo da respiração se altera e fica mais acelerado. Os exercícios respiratórios ajudam a normalizar esse ritmo, sempre com a respiração mais devagar e pausada. Aqui vão alguns exemplos, em ordem de dificuldade:

Inspirar contando de 1 até 3 e expirar contando de 3 até 1; Inspirar contando de 1 até 4, segurar o ar contando de 1 a 2 e expirar contando de 1 até 6; Inspirar contando de 1 até 4, segurar o ar contando de 1 a 2, expirar contando de 4 até 1 e deixar o pulmão vazio contando de 2 para 1.”

“Manter contato com as pessoas também é importante, especialmente com os idosos e pessoas que vivem sozinhas."

- Psicóloga Isadora Araújo

Nesse momento de isolamento social, onde o contato físico não é recomendado, quais as dicas para promover o bem estar psíquico?

“O principal é tentar coletar boas informações sobre a situação, além de filtrar a intensidade de procura por noticiários. Além disso, é importante manter uma rotina mínima, mesmo que esteja em isolamento, evitar uso excessivo de bebida alcoólica, evitar uso excessivo de café, realizar atividade física em casa, manter contato com pessoas próximas via áudio/vídeo. 

Se observar sintomas intensos de ansiedade e depressão, procurar ajuda psicológica ou médica, hoje existem muitas ferramentas via telemedicina que aproximam os cuidados de saúde sem a necessidade de o paciente sair de casa. Cuidar e manter uma rede de suporte é essencial neste momento”.

- Psiquiatra Luan Diego Marques

Escrito por: Jefferson Santos, Lindineide Noronha e Yasmin Rajab

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